Ao sul do Atlântico negro: interpelações decoloniais/afrodiaspóricas ao campo das relações internacionais
Organizador
Marcello Felisberto Morais de Assunção
Têm se tornado cada vez mais evidente a franca “decadência disciplinar” da forma tradicional ao qual o habitus escolástico produziu os saberes nas universidades ocidentais/neoliberais. Entre tantas questões a criarem limites entre a oxigenação deste espaço e os seus limites estruturais está a chamada “questão racial” e as suas diversas “intersecções” (gênero, classe, sexualidades, região, etc.). Por muito tempo essa discussão ficou relegada à campos muito estritos como a sociologia/antropologia é sempre sobre o paradigma do “negro-objeto ”. Essa chave de leitura fez com que de um lado os negros fossem os únicos objetos de estudo da “teoria crítica da raça” e ao mesmo tempo condicionou a leitura desses processos a corporeidade do sujeito clássico à ocupar as cátedras universitárias e campos culturais: o branco, masculino, oriundo de classes abastadas e heterossexual. A trajetória do centramento dos saberes/conhecimentos nesse falso universalismo tem origem em um determinado momento/período histórico: a invenção do ocidente por meio da sua expansão político e militar que se desdobra na produção da mundialização capitalista racializada a partir do que Immanuel Wallerstein referiu-se como o “longo século XVI” (1450-1650). O pensamento afrodiaspórico e a teoria decolonial latino-americana se debruçaram – através de diferentes ângulos, propostas e conceitos – exatamente nas formas aos quais esse processo de expansão capitalista por meio de um “sistema atlântico” teve o racial não só como um apêndice desse processo histórico, mas como categoria mestre da organização do mundo moderno. Esta problemática tem uma profunda relação com as reformulações das disciplinas, em franca decadência disciplinar, é que tem sido afrontadas pelos sujeitos racializados que ao entrarem nos espaços hegemônicos, e tradicionalmente exclusivos de uma certa elite branca, confrontam as ementas/planos de curso propondo outras formas de ver/sentir/interpretar o mundo por meio da categoria do “racial”. As ações afirmativas na graduação e pós-graduação foram fundamentais para revitalizar o corpo discente (com pessoas negras/periféricas) que mobilizou a universidade a rever os parâmetros de conhecimento, abalando parte do imenso iceberg da “ignorância branca ” que funda as suas bases. O campo das Relações Internacionais está profundamente imbricado à este processo de reformulação dos currículos e de tensionamento da supremacia racial branca ao qual experenciamos no ambiente universitário brasileiro e ao qual este livro busca desvendar, ofertando alguns possíveis caminhos desviantes em relação ao cânone hegemônico.