A consciência estendida: contrapondo o enativismo de Alva Noë à tese da consciência intracraniana defendida por David Chalmers
Jessica Nunes Vergara
"Qual o substrato material da consciência humana? A crença popular, científica e filosófica predominante é a de que algo dentro de nossas cabeças é inteiramente responsável por nossas realidades individuais. Alguns chegam a afirmar que somos nada mais que nossos cérebros e tudo que percebemos e sentimos é uma produção exclusiva deste órgão – para alterar o que alguém sente e percebe, bastaria alterar algo em seus cérebros.
David Chalmers, filósofo da mente que ganhou notoriedade na última virada de século, defendeu paradigmaticamente essa concepção intracraniana da consciência. Para tanto, apelou a enigmas filosóficos, tais como: a possibilidade lógica do zumbi fenomenal; o argumento do conhecimento e a hipótese do espectro invertido. Entretanto, tal concepção leva a graves problemas que desafiam a filosofia da consciência até os dias atuais: o célebre problema difícil da consciência e o problema da epifenomenalidade da consciência.
O enativismo sensório-motor, corrente filosófica que se desenvolveu ao longo dos anos 2000, desafiou essa concepção intracraniana e defendeu que a consciência emergiria não apenas a partir de nossos cérebros, mas de um substrato material mais amplo, o qual se estenderia através de nossos corpos até o mundo ao nosso redor, incluindo os próprios objetos experienciados. Nossa consciência seria, portanto, estendida.
Neste livro – cujo texto é resultado de minha pesquisa de mestrado, e foi contemplado na edição 2020 do prêmio ANPOF de melhor dissertação – busquei reconstruir ambas as teses e defender que a abordagem enativista seria mais apta para explicar nossa consciência em sua complexidade. Além disso, argumentei que o enativismo seria capaz de acomodar os enigmas apresentados por Chalmers e dissolver, ou mesmo solucionar, os graves problemas identificados."